quarta-feira, 6 de agosto de 2008

A delícia de entrar na história

A peça Subterfúgio não acontece num palco comum – ao contrário, ela se ocupa de um casarão dos anos 50, na rua Antonia de Queirós, que funciona durante o dia como um antiquário e que não poderia render cenário melhor para os temas carência, saudade, ciúme e traição, que nunca saem de moda.
Como é de se esperar num espaço como esse, o público anda e faz uma tímida participação – nada vexatória. Mas o ambiente intimista faz com que os atores não apenas encenem pequenas histórias – que não se cruzam – sobre essa fonte inesgotável que é o amor, mas também provoquem nos espectadores a sensação de que estão participando daquela ansiedade de um encontro às escuras, do sufoco de um namorado com uma mulher ciumenta, da dor de uma traição, da falta muito bem definida pela atriz parecida com uma vampira “que agoniza de saudade”.
A luz baixa, às vezes dependendo só de velas ou focos muito restritos a uma pequena parte do ambiente, contribui para a fotografia cativante, que faz com que a platéia torça por aquela história de carentes ansiosos que se vêem pela primeira vez, para que a ciumenta propositadamente vendada dê um passo além de sua neura, para que o casal homossexual se reconcilie e para que a traumatizada se recupere da perda amorosa com a ajuda de um sinistro conselheiro.
Os solitários que se paqueram numa primeira saída tentam esconder seus grilos e receios, o namorado devotado tenta mostrar à namorada cega de ciúme que não há garantias, o casal gay tem dificuldade de transpor a incômoda traição heterossexual e o aparente garoto de programa tenta convencer a sinistra entrincheirada em seus medos que é preciso arriscar, pois amar é como dançar, mas ela sua amargura persiste: “que se tudo na vida passa, como nós permaneceríamos” ?
A interferência sonora da rua nas cenas externas não colabora, as cadeiras firmes demais e pouco confortáveis para os pesos pesados também não. São os únicos “se não” da encenação, que traz à tona a fonte inesgotável de debates, reflexões, discussões e devaneios sensoriais: as paixões humanas. Uma surpresa e tanto vinda de jovens e pouco conhecidos atores.
Subterfúgio
Rua Antonia de Queirós, 165
Reservas: Francine 9235-0402
Até o fim de setembro
Quintas, sextas e sábados, 22h

Nenhum comentário: